A população mundial está envelhecendo. E com o avanço da idade, novos desafios para a saúde aparecem. Um deles, pouco comentado, mas cada vez mais comum, é a obesidade sarcopênica. Essa condição, que une duas situações de risco – a obesidade e a sarcopenia (perda de massa e força muscular) – traz impactos significativos na funcionalidade e na qualidade de vida do idoso.
O que é obesidade sarcopênica?
É uma condição caracterizada pela coexistência de excesso de gordura corporal (especialmente gordura visceral) e redução de massa magra, principalmente massa muscular. Isso compromete a força, o equilíbrio e a mobilidade do idoso.
Enquanto a obesidade aumenta o risco de doenças cardiovasculares, diabetes e inflamação crônica, a sarcopenia está associada a quedas, fraturas e perda da autonomia. Juntas, elas potencializam os efeitos negativos uma da outra.
Como ela se desenvolve?
Vários fatores contribuem para o surgimento da obesidade sarcopênica:
Redução do metabolismo basal com a idade;
Sedentarismo;
Alteracões hormonais;
Inflamação crônica de baixo grau causada pelo excesso de gordura visceral;
Resistência anabólica, dificultando a formação de nova massa muscular;
Deficiências nutricionais, especialmente proteicas.
A gordura se acumula dentro dos músculos (lipotoxicidade), afetando sua função e promovendo inflamação. Isso cria um ciclo vicioso: mais gordura → menos músculo → menos movimento → mais gordura.
Quais os riscos?
Pacientes com obesidade sarcopênica têm risco aumentado de:
Quedas e fraturas;
Fragilidade e dependência funcional;
Hospitalizações frequentes;
Piora da qualidade de vida;
Maior mortalidade.
Como diagnosticar?
O diagnóstico da obesidade sarcopênica exige uma avaliação combinada da composição corporal e da função muscular. Não há um único exame que defina a condição, mas sim um conjunto de critérios. Os principais passos são:
1. Avaliação da massa corporal:
Índice de Massa Corporal (IMC) pode ser enganoso, pois não diferencia gordura e músculo. Um IMC normal ou alto pode esconder uma perda significativa de massa muscular.
Bioimpedância elétrica (BIA): mede a proporção de gordura e massa magra.
Absorciometria por dupla emissão de raio-X (DEXA): método de alta precisão para avaliar a composição corporal, incluindo gordura visceral e massa muscular apendicular (dos braços e pernas).
2. Avaliação da função muscular:
Força de preensão manual (dinamometria): avalia a força da mão e é um bom indicativo da força global. Valores abaixo de 26 kg para homens e 16 kg para mulheres sugerem baixa força muscular.
Velocidade da marcha: caminhar menos de 0,8 m/s é indicativo de baixa performance física.
Teste de sentar e levantar dacadeira em 30 segundos ou o teste de levantar-se e andar 4 metros (Timed Up and Go) também ajudam a avaliar o desempenho funcional.
3. Critérios diagnósticos sugeridos:
Segundo as diretrizes europeias (EWGSOP2)
Presença de excesso de gordura corporal (avaliada por IMC, BIA ou DEXA)
Presença de baixa massa muscular (massa magra reduzida em relação ao peso corporal)
Presença de baixa força muscular e/ou baixo desempenho físico
A obesidade sarcopênica é diagnosticada quando esses três domínios estão comprometidos.
Existe tratamento?
Sim, e os melhores resultados vêm da combinação de estratégias:
1. Alimentação adequada
Ingestão proteica adequada (em torno de 1,2 a 1,5 g/kg/dia);
Alimentos ricos em leucina (como ovos, leite, carne, leguminosas);
Manutenção ou leve redução calórica, sem comprometer nutrientes;
Avaliação de deficiências de vitamina D e outros micronutrientes.
2. Exercícios físicos: a estratégia mais eficaz
O estudo publicado no New England Journal of Medicine mostrou que exercício combinado (aeróbico + resistido) é mais eficaz que apenas aeróbico ou apenas resistido para melhorar a performance física em idosos com obesidade.
O grupo que fez exercício combinado teve melhora de 21% no desempenho funcional;
O consumo de oxigênio (capacidade cardiorrespiratória) melhorou em 17 a 18%;
A força muscular aumentou em até 19%;
A perda de massa magra foi menor em quem fez musculação;
Todos os grupos que se exercitaram perderam peso e melhoraram qualidade de vida.
Recomendação: realizar musculação de 2 a 3 vezes por semana e exercícios aeróbicos moderados como caminhada, bicicleta ou hidroginástica.
3. Tratamento medicamentoso (casos selecionados)
Uso criterioso de terapia hormonal.
Investigam-se medicamentos como inibidores de miostatina ainda estão em fase de estudo.
E para prevenir?
A melhor forma de lidar com a obesidade sarcopênica é agir antes que ela se instale:
Mantenha-se ativo durante toda a vida;
Alimente-se bem, com boas fontes de proteína;
Evite dietas restritivas sem acompanhamento;
Trate a obesidade com foco em manter a musculatura;
Faça acompanhamento médico regular.
Conclusão
A obesidade sarcopênica é um desafio crescente no envelhecimento. Ela não é apenas “ter gordura” ou “perder músculo”: é uma condição que compromete profundamente a saúde, o bem-estar e a independência do idoso.
A boa notícia é que há tratamento. E quanto mais cedo ele começar, melhores os resultados.
Referências:
Batsis JA, Villareal DT. Sarcopenic obesity in older adults: aetiology, epidemiology and treatment strategies. Nat Rev Endocrinol. 2018;14(9):513–537.
Villareal DT, et al. Aerobic or Resistance Exercise, or Both, in Dieting Obese Older Adults. N Engl J Med. 2017;376:1943–1955.